domingo, 9 de agosto de 2009

Marca sem crise

Especialista em comunicação corporativa dá dicas de gerenciamento de crise.
Marca sem crise

Perda de clientes, de reputação e de lucro. São muitas as perdas de uma empresa que passa por uma crise de imagem. Mas sem o gerenciamento da crise, ela pode ser irreversível. "Um período de crise não é o momento de recuar, mas de ter cautela e muito planejamento”, explica Sulamita Mendes, co-autora do livro “Sobreviva à Crise - um manual para superar o momento atual".

Sulamita, que é especialista em comunicação corporativa, gestão de crise, e media training, diz que é possível sim contornar crises, basta planejamento.

Consumidor Moderno: Que tipo de acontecimento pode ser considerado uma "crise"? Qual o mais danoso à marca?
Sulamita Mendes: É importante que o gestor compreenda a diferença entre crise e problema. Problema é resolvido internamente na empresa. Crise atinge âmbito externo a ela. A crise pode envolver um produto, desde sua composição, conservação e embalagem. Ou ações antiéticas de colaboradores, e processos da própria empresa.
Pode ser uma crise econômica, como a que a economia global está passando hoje e de reputação. As causas podem ser externas e internas. No caso das externas, são as sabotagens durante distribuição ou venda, ou a própria crise econômica. Já nas causas internas, podemos listar a falta de segurança na linha de produção, falha de equipamento ou de conduta.
Em termos de danos de imagem, não tem o de maior ou menor intensidade. Todos são sérios, alguns até irreversíveis, mas todos trazem resquícios para marca.

CM: Qual a primeira providência que o executivo deve tomar? E a pior?
SM: A primeira providência vem antes mesmo de uma crise ser instalada. Na verdade, é preciso ter um bom planejamento, que englobe até a prevenção de crises.
A pior providência é não tomar conhecimento ou fingir que nada acontece...aí foge do controle.
Então, de uma forma prática, supondo que não foi feito um plano de crise anteriormente, a primeira providência é montar um comitê gestor e rápido, pois os primeiros momentos são os mais importantes.

CM: Em caso de crise, existe um roteiro que se deva seguir? Como saber se ele está funcionando para reverter a crise?
SM: Sim, deve existir um roteiro a ser seguido, que é a montagem de um Comitê Gestor de Crise ou comitê Emergencial. Este Comitê deve reunir colaboradores de todos os níveis, do operacional à direção e deve envolver todas as áreas. Isso cria agilidade, porque cada colaborador encarregado pela sua área será o responsável por conduzir seus companheiros para a melhor forma de conter a crise.
E isto deve ser montado antes da crise acontecer pra que as perguntas norteadoras das ações devam ser feitas antes e não durante - isto atrapalha tanto na agilidade quanto na neutralidade emocional das tomadas de decisões.
Sem contar que a crise não pode interferir na continuidade da produção da empresa e o comitê tem que prever quem continua trabalhando na rotina diária e quem deve mudar de rotina em função de contornar a situação.
Existem casos de grandes empresas em que são necessários mais de um comitê, como por exemplo, comitê de comunicação interna e comitê de comunicação externa, claro que interligadas.
Mensurar resultados é a forma de perceber se está acertando nas decisões. Por exemplo, a imprensa está toda batendo à porta pra ter informações. Criar uma forma de atendê-la, como uma coletiva, um blog, um release, um relatório, um porta voz treinado, pode diminuir a procura da imprensa. Se não diminuir é porque as informações estão inadequadas, muito técnicas ou imprecisas.
Algumas situações de crise demoram para serem revertidas. Pra isso é preciso um plano de ação que priorize o que é mais urgente, já com prazos e metas a serem atingidas. E monitorar, acompanhar o que está sendo feito.
Lembre-se que um planejamento não pode ser "engessado", não pode ser feito e pronto. Ele é um norteador pra não se perder do foco.

CM: Conte um caso de gerenciamento de crise em que você tenha participado.
SM: Eu trabalhava para uma organização nacional. O nome de um dos colaboradores apareceu em toda a mídia nacional, envolvido em um escândalo. Imediatamente e de forma discreta, fui até o RH e verifiquei nome e documentos. Foi um daqueles lances de experiência que me fez fazer isto primeiro. Logo verifiquei que era um homônimo... Nosso colaborador, coitado, tinha o mesmo nome daquele que estava envolvido no escândalo...e por azar nosso e dele, ele estava fora do país, o que poderia comprometer mais ainda a imagem da empresa e a dele, porque poderia transparecer fuga.
Após informar a diretoria sobre o ocorrido, minha equipe e eu nos organizamos em preparar dois documentos: um detalhando para todos os colaboradores o ocorrido. Outro, para a imprensa. Enquanto isto, eu tentava localizar o colaborador para que ele soubesse da notícia por mim, e não de outra forma. Orientei a ele de que se procurado pela imprensa apenas respondesse que se tratava de um homônimo e que a assessoria de comunicação poderia dar mais detalhes. Quanto menos falar nesta hora, é melhor. A mesma recomendação passei para sua família.
Apesar de todo o cuidado, o porteiro do prédio deu uma declaração a um programa sensacionalista. Mas nada grave, conseguimos depois uma nota de retratação.
Voltando aos fatos. Como tanto eu como minha equipe mantemos uma relação aberta e verdadeira com a imprensa, nenhum meio, jornal, rádio, internet, do Brasil, deu continuidade ao equívoco.
Este é um exemplo que mostra que gestão de crise não fica restrita à empresa, neste caso extrapolou pro meio familiar. Também é interessante perceber o relacionamento anterior tanto com a imprensa quanto com os colaboradores da empresa, que confiaram nas informações passadas e não fizeram “rádio corredor” ou publicaram informação incorreta. Como essa empresa já tinha um histórico de treinamentos em media training, não precisei perder tempo em explicar, mas só em orientar.

CM: Comente um case de gerenciamento de crise que você considere emblemático.
SM: Este caso recente da Air France, mostra um caso que deu certo. Foram ágeis em retirar os clientes do salão de check-in - isso poderia gerar um estresse maior entre os familiares e os funcionários, como a gente viu em outros casos semelhantes de acidente aéreo.
O tempo todo havia um porta-voz que passava informações, dando o mínimo de margem pra alguma matéria mais sensacionalista. Os familiares foram deixados isolados, evitando desta forma cenas de dor que podem ser utilizadas de forma negativa tanto pela imprensa, quanto por pessoas que aproveitam pra aparecer. Enfim, foi muito profissional.
Em relação a crises que não foram contornadas, basta a gente lembrar os dramas de outros acidentes aéreos anteriores. Funcionários foram agredidos ao invés de compreenderem a dor e desespero do outro que não tinha informações dos parentes. Eles tinham que ter sido treinados antes e sair do foco. Faltou treino! Media Training!

Gostaria de deixar o alerta de que hoje é muito mais fácil uma empresa ou pessoa ter sua imagem destruída, inclusive por má fé. Os meios eletrônicos são ágeis e basta uma foto na internet tirada de um celular, por exemplo, pra colocar em risco todo um trabalho ético e um nome de um profissional respeitado. Claro que existem as leis, mas é bom ficar alerta! A transparência nas atitudes e nos negócios não é só uma questão de governança corporativa, mas também de gestão de crise. Se existe uma conduta anterior ética, é mais difícil emplacar uma notícia destruidora, negativa.

(pulbicado em julho deste ano http://consumidormoderno.uol.com.br/zmi/consumidormoderno/canais/vendas/marca-sem-crise/view

Um comentário:

Leonardo Bragança disse...

Sulamita, gostei muito da entrevista. Convido-a a visitar meu blog, sobre comunicação empresarial, marketing interno e branding, o http://prezadoscolaboradores.wordpress.com

Quem sabe em breve podemos falar mais, em entrevista, sobre o assunto?

Abraços